Nova economia

:: A Comunicação e a nova economia

J.S. Faro*

      Na verdade, falar em Comunicação e em Nova Economia é trabalhar com dois dos eixos fundamentais da vida contemporânea. Mas discutir isso com profissionais da Comunicação Empresarial é estimulante, porque particularmente considero a Comunicação Empresarial um processo de atividades extraordinariamente dinâmico – chego mesmo a acreditar que é um processo, ao lado da própria atividade produtiva, disseminador de padrões culturais modernos e, por conta disso, elemento atuante da própria acumulação de capital.
      Mas eu sou um historiador, embora voltado para questões das Ciências da Comunicação. E historiadores são cientistas basicamente conservadores e desconfiados, que trabalham com um universo de conceitos estabelecidos e consagrados, razão pela qual confesso que o tema é duplamente desafiador: de um lado, porque coloca a necessidade de analisar um fenômeno estrutural da vida social, que é a Comunicação; de outro, porque remete ao conceito de uma "nova economia", e esta é uma idéia que me produz uma certa hesitação em aceitá-la, porque eu não tenho certeza de que o termo é adequado para explicar a atual conjuntura do capitalismo. E é em torno disso que eu gostaria de iniciar minha palestra.
      O que é essa "nova economia"? Em busca dessa resposta, faço uma rápida reflexão sobre o seu processo constitutivo para que se possa extrair todos os elementos que permitam ver a Comunicação como um aspecto fundamental deste nosso tempo, ainda que ela – a Comunicação – possa ser vista como um componente fundamental de todos os tempos.
      Os historiadores trabalham com a idéia de que a Humanidade assistiu a duas Revoluções Industriais:
      A primeira começou na 2ª metade do século XVIII, e foi caracterizada pelo surgimento de novas tecnologias – como a máquina a vapor, o tear mecânico; de forma geral pela substituição das ferramentas manuais (que caracterizavam a manufatura) pelas máquinas.
      A segunda, um século depois (por volta da 2ª metade do século XIX), marcada também pela introdução de outras tecnologias – como o desenvolvimento da eletricidade, do motor de combustão interna, de produtos químicos de base científica e pelo início de tecnologias de comunicação – com a difusão do telégrafo e a invenção do telefone.
      O que esses processos têm em comum? Fundamentalmente, tratou-se de processos realmente revolucionários, de tal forma que sua importância na configuração da sociedade contemporânea só tem comparação com os processos que levaram à passagem do período paleolítico ao neolítico. E foram revolucionários porque introduziram uma mudança estrutural tanto nos padrões de produção quanto nos padrões de consumo – ainda que se trate de mudanças não lineares, quer dizer, elas não aconteceram todas ao mesmo tempo nem ocorreram igualmente em todos os países. Mas em termos de tendências que podem ser observadas a partir da emergência da maquinofatura, não resta dúvidas de que a partir da Inglaterra do século XVIII, a história humana mudou de perfil.
      Depois, além desse traço comum, há um outro, que considero muito importante: a inovação técnica e o consequente aumento vertiginoso da produção que ela permitia, nos dois casos, foram responsáveis pela incorporação de todo o planeta na racionalidade de funcionamento da economia industrial – uma ampliação sem precedentes do mercado, tanto o mercado fornecedor de matérias-primas quanto o mercado consumidor de bens manufaturados.
      Tenho a impressão de que, vista a História sob os períodos de longa duração, é aí, já no final do século XVIII, que podemos buscar a gênese de uma economia global (se é que isso já não estava sendo gestado desde o Renascimento Comercial nos séculos XIV E XV).
      Mas há uma diferença entre os dois processos que precisa ser destacada. Enquanto na primeira Revolução Industrial a inovação tecnológica advém da pura experiência prática e é errática em termos geográficos – com a Inglaterra assumindo o pioneirismo e a liderança do processo; na segunda Revolução Industrial o conhecimento científico atua como sustentáculo e guia do desenvolvimento da técnica.
      Essa diferença foi fundamental porque a produção do conhecimento científico que resultava em sucessivas e rápidas inovações no campo da produção de bens não apenas decorria de um maior processo de acumulação verificado nos países europeus e nos Estados Unidos, como acabava por demarcar de forma definitiva a divisão dos países entre os que geravam a técnica e acumulavam riqueza e aqueles que ficariam relegados à periferia do sistema, fornecedores de matérias-primas e consumidores de industrializados; geradores de riqueza, mas sem processo acumulativo de vulto – base do subdesenvolvimento e do atraso generalizado que se observa em suas sociedades.
      Esse processo inaugurado pela Segunda Revolução Industrial terá prosseguimento na II Guerra Mundial com a intensificação de novas descobertas em eletrônica, especialmente na microeletrônica. Manuel Castells considera esse o cerne da Revolução da Tecnologia da Informação no século XX. (1) Há uma sucessão de episódios que testemunham isso: a invenção do transistor em 1947; o circuito integrado em 1957; o microprocessador em 1971; os PCs entre o fim dos anos 70 e a primeira metade dos anos 80.
      No limite, é possível afirmar que a Revolução da Tecnologia da Informação não tem sido mais que o resultado de uma sequência histórica que reproduz elementos que estão presentes de forma latente na economia desde a Revolução Industrial, daí porque, para os historiadores que observam tendências seculares, a idéia de uma Nova Economia é de difícil aceitação (2). Provavelmente nós estamos testemunhando o acabamento de uma era, com a certeza de que este momento introduz novos elementos culturais, da mesma forma como isso ocorreu em cada período; mas não se trata, segundo eu acredito, de uma "nova" economia, senão de uma fase da mesma economia gerenciada de acordo com as transformações já apontadas.
      Aliás, o termo "nova economia" tem se prestado a uma infinidade de definições, tão grande é a sua fragilidade. A revista Veja, por exemplo, trata de nova economia o processo de fusão da American On Line com a Time Warner (3), e todos nós sabemos que o processo de mega-fusões empresariais tem sido constante no capitalismo desde o início do século XX. O jornal Le Monde, em artigo assinado por Ignacio Ramonet, define nova economia como "o transporte instantâneo dos dados imateriais e a proliferação das ligações e das redes eletrônicas", cujo coração é a Internet, mas ele próprio se encarrega de ressalvar que "as vias expressas de comunicação representam para o momento atual o mesmo que a estrada de ferro significou para a era industrial: vigorosos fatores de impulso e de intensificação das mudanças" (4), e todos nós sabemos que as ferrovias não foram criadoras de nenhuma nova economia, senão sustentação da expansão do capitalismo. Para Alain Touraine, se por nova economia se entende a lógica econômica mundial contemporânea, marcada pela realocação de recursos entre as fronteiras nacionais, trata-se de um engano porque "as políticas nacionais exercem um papel predominante no estado da economia", já que ela não se reduz às "trocas financeiras internacionais" (5).
      Vê-se, portanto, que estamos diante de um conceito mais jornalístico que econômico, e não há nada até agora que justifique a idéia de que esteja surgindo um novo modo de produção ou sequer uma nova doutrina que fundamente a idéia de uma "nova economia". Particularmente, prefiro pensar que as tecnologias da informação representam o acabamento de uma era, talvez o ponto culminante e basicamente gerencial do capitalismo industrial e financeiro.
      Quais são os traços desse "acabamento de uma era"? Ou, em outros termos, quais são as marcas desse gerenciamento? O mais importante deles é que a intensidade das transformações tecnológicas verificadas nos últimos 20 ou 30 anos deslocou o processo de acumulação do capital e a sua fonte de produtividade para a geração de conhecimentos, o processamento da informação e a comunicação de símbolos.
      É verdade que conhecimento e informação são elementos fundamentais em qualquer sistema econômico, uma vez que o processo produtivo sempre se baseia em algum grau de conhecimento e no processamento da informação. O que é específico do nosso tempo, é que o conhecimento e a informação deixaram de ser instrumentos para um fim produtivo e tornaram-se fins deles próprios, subjugando o processo produtivo à sua racionalidade - já que reside neles o eixo da capacidade acumuladora do sistema. Recorro ainda uma vez a Manuel Castells: "o processamento da informação é focalizado na melhoria da tecnologia do processamento da informação como fonte de produtividade, em um círculo virtuoso (sic) de interação entre as fontes de conhecimentos tecnológicos e a aplicação da tecnologia para melhorar a geração de conhecimentos e o processamento da informação" – círculo que se constituiria num novo paradigma tecnológico, diverso dos anteriores (6).
      Dessa forma, enquanto o capitalismo industrial estava voltado para a maximização da produção, esta etapa da vida econômica está voltada para o desenvolvimento tecnológico – que exerce sobre o sistema produtivo um efeito centrípedo e sobre a sociedade em geral um efeito centrífugo.
      Embora essas características tenham um perfil econômico, porque é nessa esfera que elas se processam, seus efeitos se difundem por todo o conjunto de relações e estruturas sociais, o que significa que o modo de desenvolvimento da economia atual modela todo o comportamento social – inclusive as relações humanas decorrentes da comunicação simbólica. Constitui-se assim uma relação de intimidade entre cultura e forças produtivas, "espírito e matéria", que jamais ocorreu em qualquer outro sistema produtivo.
      Gostaria de aprofundar esse aspecto, identificando nele algumas constatações e contradições que considero importantes para o nosso tema. A primeira constatação já é um lugar comum: as novas tecnologias, da forma como atuam no mundo da produção, estão integrando o mundo em redes globais de instrumentalidade e um número variado de comunidades virtuais. A segunda constatação diz respeito à ruptura que as novas tecnologias provocam na cultura da recepção das mensagens.
      Não tenho dúvidas de que foi o alfabeto que proporcionou a base mental para a comunicação fundada no conhecimento, ainda que se possa observar que a "ordem alfabética" separava a comunicação escrita do sistema audiovisual de símbolos e percepções, estabelecendo uma hierarquia social entre essas duas formas de recepção: a alfabética e a audiovisual. No século XX parece que a estrutura audiovisual de recepção retoma seu papel: o filme, o rádio e a televisão acabaram por superar a influência da comunicação escrita para a maioria das pessoas, apesar dos protestos dos intelectuais provocados pela tensão entre a nobreza da comunicação alfabética e o caráter "vulgar" da comunicação sensorial não-reflexiva.
      As novas tecnologias estão provocando uma nova ruptura – o aparecimento de uma metalinguagem que integra no mesmo sistema as modalidades escrita, oral e audiovisual da comunicação humana. É como se o espírito humano reunisse suas dimensões em uma nova interação de textos, imagens e sons, interagindo a partir de pontos múltiplos, no tempo escolhido em uma rede global, em condições de acesso aberto – fenômeno que altera de forma fundamental o caráter da comunicação. Para Neil Postman, "nós não vemos a realidade como ela é, mas como são nossas linguagens. E nossas linguagens são nossas mídias. Nossas mídias são nossas metáforas. Nossas metáforas criam o conteúdo de nossa cultura" (7).
      Como a cultura é mediada e determinada pela comunicação, nossos sistemas de crenças e códigos historicamente produzidos são transformados de maneira fundamental pelo novo sistema tecnológico – baseado numa cultura de virtualidade, no fim da audiência de massa e no surgimento de redes interativas. Nós estamos apenas assistindo à pré-história desse processo.
      Na verdade, aquilo que tem sido chamado de "nova economia" cria uma nova comunicação que, por sua vez, cria uma nova cultura que vai estimular o desenvolvimento de suas bases materiais. Estamos diante de um novo padrão espistemológico que apresenta uma extraordinária dificuldade para que se identifique o seu ponto de partida. A melhor imagem é a de um círculo marcado por setas contíguas.
      A terceira constatação, no entanto, é contraditória: essa rede informacional da produção econômica, da atividade financeira e da vida cultural interativa tem sido acompanhada por uma tendência social e política que vai no sentido oposto: a construção da ação social e das políticas em torno de identidades primárias – ou recuperadas pela etnia, pela religião, pela história, ou recém-construídas sob a forma de movimentos que buscam instaurar novos significados políticos (ONGs) ou novas formas de espiritualidade (o Brasil parece ser um exemplo rico dessas experiências e todas as nossas vicissitudes sociais colaboram para isso – concentração da renda, disparidades regionais e sociais, desemprego, dívida externa etc).
      Em qualquer hipótese, a sociedade informacional, base da época que estamos vivendo, nasce marcada pela busca da identidade como princípio, identidade entendida aqui como "o processo pelo qual um ator social se reconhece e constrói significado principalmente com base em determinado atributo cultural ou conjunto de atributos, a ponto de excluir uma referência mais ampla a outras estruturas sociais" (8), o que significa que a chamada nova economia está reforçando – ou reavivando – padrões de comportamento social não necessariamente pertinentes ou correspondentes ao seu cosmopolitismo.
      Tenho a impressão que esse "desvio" indica a possibilidade de duas alternativas: ou estamos diante do início de um processo que traz em si o germe de uma integração total, ou estamos diante da emergência de uma formação social que, no futuro, estará cindida em dois polos sociais antagônicos constituídos pela antítese entre indivíduos "funcionais" e indivíduos "disfuncionais". Em qualquer caso, a comunicação funcionará como alicerce e parte da sua eficácia em torno de um ou de outro projeto estará na dependência dos seus conteúdos, para além da técnica.
      Gostaria de ir um pouco mais fundo na análise das causas que provocam essa contradição. A primeira delas diz respeito à dicotomia existente entre o projeto original da modernidade, fundado nos valores do humanismo que alicerçaram o desenvolvimento do capitalismo no plano ideológico – desde o século XVI – e o desenvolvimento posterior desse sistema, especialmente a partir do século XIX. Se a segunda Revolução Industrial acenava com a perspectiva da abundância, a sua prática era a da exclusão social, processo que, no século XX, foi bastante acentuado. Na verdade, o conceito de progresso – tão caro ao pensamento racionalista que domina toda a cultura ocidental desde o Renascimento – converteu-se na idéia e na prática da acumulação, transformando a sociedade em mera condição de produção, já que o desafio da acumulação – permanentemente enfrentado pelo caráter privado da racionalidade do sistema – foi vencido pela ampliação da mercantilização da vida, compulsoriamente ampliada para toda a rede de bens e serviços, inclusive para as relações sociais – processo que se estendeu para qualquer ponto do globo.
      O resultado é que essa lógica – que faz a apologia do mercado e da redução do papel do Estado – acabou por fortalecer a celebração de uma cultura marcada por estilos de vida e de imaginários sociais individualistas, privatistas e consumistas (9) que, em sua formulação, provocam um profundo alheamento do indivíduo em relação ao mundo que o cerca – uma sensação de colapso da História; de "irracionalidade" que conflita com a lógica das quantidades. Isso é verdade desde a catástrofe ecológica até a extensão da miséria e da fome mesmo entre os países de economia central (10). Dou um exemplo: reportagem recentemente publicada pela revista Veja (11) dá conta de algumas informações importantes sobre a economia mais pujante do mundo, a norte-americana. Segundo a matéria, o PIB dos EUA – cuja população representa 5% dos habitantes do planeta - é maior que a soma do PIB da França, da Alemanha e do Japão; o país consome 1/3 das importações mundiais; 1/3 da energia elétrica do mundo; 5 trilhões de dólares em lojas, supermercados e viagens (seis vezes o consumo do Brasil) etc. Esse mesmo país, no entanto, tem atravessado um processo de exclusão social e de expansão do empobrecimento relativo de sua população que contrasta com esses números da revista Veja: o patrimônio médio da classe média era, nos anos 90, de US$ 43 mil; enquanto o patrimônio médio da parcela do 1% mais rico da população era de US$ 7.925.000. No mesmo período, essa parcela de 1% da população aumentou seu patrimônio em 28,3%, enquanto os 40% mais pobres das famílias norte-americanas viram seu patrimônio diminuir 49,7%, o que confirma a tese de que todo o apogeu da economia do país não tem sido suficiente para resolver três problemas endêmicos de seu sistema econômico: a maior desigualdade, a maior polarização entre ricos e pobres e a generalização da pobreza. Por último: em 1973, o percentual de indivíduos que se encontravam abaixo da linha da pobreza era de 11,1%; em 1994 esse percentual subiu para 14,5% (12).
      Podemos também ficar com o exemplo do próprio Brasil, cuja economia é uma das que mais cresceu no mundo todo neste século – a ponto de situar-se hoje entre as 10 mais importantes do globo. As distorções, no entanto, parecem ter corrido de forma paralela, conforme mostra este texto do Prof. Reinaldo Gonçalves, professor titular de economia da UFRJ, ex-presidente do Instituto de Economistas do Rio de Janeiro e economista da ONU (UNCTAD):

"Quatrocentas mil famílias, pouco mais de 1,5 milhão de pessoas, controlam cerca de 20% da renda nacional e mais da metade do estoque de riqueza nacional. Considerando um PIB de US$ 800 milhões e um estoque líquido de riqueza priada de US$ 2 trilhões, as elites brasileiras controlam uma renda anual da ordem de US$ 160 bilhões e uma riqueza de US$ 1,1 trilhão, o que corresponde a uma renda familiar anual média de US$ 400 mil e uma riqueza familiar média de US$ 2,7 milhões. O restante 99% (sic) da população brasileira (39,6 milhões de famílias ou 158 milhões de pessoas) responde por uma renda familiar anual média de US$ 16.000 e uma riqueza familiar média de US 24.000. Assim, a renda média das elites é 25 vezes maior que a renda média do restante da população e a riqueza média das elites é 110 vezes maior do que a riqueza média do restante da população brasileira".(13)

      A constatação de Reinaldo Gonçalves foi recentemente confirmada pela Síntese de Indicadores Sociais que o IBGE divulgou. Segundo o instituto, no Maranhão 67,2% das famílias com crianças de até seis anos vive com menos de um salário mínimo. Em São Paulo, esse percentual é de 9,8%. Mas a média brasileira é de 30%. Pior que isso: o rendimento dos 40% mais pobres da população brasileira é de R$ 125,04, enquanto o rendimento dos 10% mais ricos é de R$ 2.477,65. E mais: das 45,2 milhões de famílias brasileiras, 19,6% têm renda per capita inferior a meio salário mínimo (14).
      Esse quadro mostra o caráter sintomático e tristemente cébre da polêmica nacional que envolveu a fixação do salário mínimo em R$ 151,00, indicando a ironia do significado da inserção brasileira na economia global (15).
      Portanto, se é verdade que o mito da nova economia e todo o aparato tecnológico que a cerca representam a materialização de um universo revolucionário do ponto de vista da sua eficácia sistêmica, ela pode estar sendo torpedeada por uma crise social de proporções alarmantes, e não é imaginável que, nesse processo, a comunicação não tenha um papel a desempenhar – como legitimadora ou como um sinal de alerta.
      Tudo indica que a nova economia fará com que se repita, no âmbito da comunicação, uma lei perversa identificada por Pierre Lévy: "o paradoxo dos sistemas de comunicação de vocação universal consiste em que estes geram quase automaticamente exclusão", e pode residir nesse processo a ameaça de que essa nova economia não seja mais que a repetição das mesmas mazelas que caracterizaram os outros momentos da Revolução Industrial. Mas pode acontecer o inverso: é possível que os profissionais da comunicação que atuam nesse sistema – e a comunicação empresarial está no centro dele – percebam que devem colocar a sua compreensão do que ocorre no mundo a serviço da recuperação do caráter finalista da economia e, com isso, torná-la global – não meramente no sentido geográfico ou físico do termo, mas no seu sentido universal, socialmente universal.

      Referências bibliográficas

1) Manuel Castells, A Era da Informação: economia, sociedade e cultura (vol I – A Sociedade em Rede). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999

2)Para Pierre Lévy (A Revolução contemporânea em matéria de comunicação. Porto Alegre: Edipucrs/Sulina, 1999), "A revolução industrial, que começou a perturbar essa situação (a estrutura agrária da Europa), aparece hoje como o início de um processo conduzindo à revolução informacional contemporânea" (pág. 197).

3) Revista Veja, edição 1632, ano 33, no. 3, de 19 de janeiro de 2000

4) Le Monde, edição eletrônica de abril de 2000 (http://www.diplo.com.br)

5) Alain Touraine. A exuberância racional da nova economia. Folha de S.Paulo, Mais!, 7 de maio de 2000.

6) Idem, pág. 35.

7) Neil Postman, Technopoly. Nova Iorque: Pantheon, 1992

8) Idem, pág. 39.

9) Boaventura de Sousa Santos, Pela mão de Alice. São Paulo: Cortez Editora, 1999.

10)Veja-se, por exemplo, a instigante questão lançada por Eric Hobsbawn em debate recentemente publicado pelo caderno Mais!, do jornal Folha de S.Paulo (7 de maio de 2000). O historiador inglês considera que a questão das identidades primárias é um "problema de segunda ordem". Mais significativo – diz ele – é o problema da democracia. "O que significa hoje para o cidadão atuar sobre seu governo?", pergunta. Em resposta à questão, ele próprio sentencia: "Significa cada vez menos. É nesse ponto em que a globalização e a substituição da soberania do consumidor pela soberania do cidadão se torna um problema. Viver num país que promove eleições multipartidárias não produz automaticamente cidadania política. Vejam os níveis decrescentes de participação nos Estados Unidos. A participação no mercado substituiu a participação na política, portanto precisamos repensar todo o problema da democracia". Certamente foi essa conjuntura que levou Regis Debray a afirmar que os os shoppings centers que se espalham pelo mundo são os locais onde as classes médias fazem suas assembléias. Se entendermos que a comunicação é parte fundamental nesse processo, entende-se também porque ela "explode" no plano das suas quantidades, mas implode no plano de seus significados: são estes últimos que remetem à cultura da participação na vida política tal como o projeto da modernidade o entende.

11) Susto no império americano. Revista Veja, edição 1646, ano 33, no. 17, de 26 de abril de 2000.

12)Manuel Castells. A Era da Informação: economia, sociedade e cultura (vol III – Fim de milênio, pág. 159). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999

13) Reinaldo Gonçalves, Distribuição de riqueza e renda: alternativa para a crise brasileira. In: Ivo Lesbaupin (org), O desmonte da nação. Petrópolis: Vozes, 1999, págs 45 e 46.

14) Jornal do Brasil, edição de 29 de abril de 2000.

15) As questões econômicas e de distribuição da renda podem não ser as mais dramáticas vividas pela população brasileira nessa sua viagem rumo à globalização. Juntamente com elas está a perversidade do pacto político conservador que rege esse quadro e que, para além de seu projeto de modernização internacionalizado, opera no sentido de manter intocadas todas as estruturas que nos qualificam como um país periférico: o estatuto da terra, os baixos salários, a redução de direitos. Esses fatos levaram o filósofo Paulo Arantes a afirmar que a "glamourização do dinheiro" praticada pelas elites nacionais é a comprovação de que "a globalização não é somente um fenômeno econômico, mas um projeto político de dominação, no qual o Estado é tão fundamental quanto o capital..." (jornal Valor Econômico, caderno Eu &, 12 de maio de 2000).

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*J.S. Faro é Professor da UMESP e da PUC-SP. Ex-presidente da Sociedade de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – INTERCOM. Autor do livro Revista Realidade, 1966-1968. Tempo da reportagem na imprensa brasileira. Porto Alegre: Editora da Ulbra/AEG, 1999.

 
 
 
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