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Comunicação mercadológica

:: O colecionismo como motivação para a comunicação mercadológica

Gino Giacomini Filho*

      Diante de mercados cada vez mais competitivos, o marketing e a comunicação buscam alternativas para promover e diferenciar os produtos, posicionando-os de forma correta junto aos desejos de seus consumidores. A necessidade por inovações, entretenimento e lazer, tem levado uma quantidade substancial de pessoas a aderir ao colecionismo, notadamente quando dispõem de tempo e condições sociais para isso. A promoção de "coleções" encontra eco perante as pessoas que buscam nesse hobby algo que complete sua rotina ou estilo de vida, fornecendo ao marketing insumo para agregar valor às marcas e cativar diversos públicos, principalmente as crianças.
      Os termos "colecionismo" e "coleção", neste trabalho, estão revestidos de conceito idêntico, ou seja, reunião de objetos empreendida por pessoas, com a finalidade de atender necessidades psico-sociais. Para o colecionador, pode haver diferentes estímulos, desde o de reproduzir comportamento de outra pessoa, até o de transformar o seu acervo em fonte de renda.
      Ao considerar o proveito mercadológico para a questão, é possível estabelecer três tipologias básicas para o ato de colecionar:

1) Atividade reprodutória: o colecionismo se dá por imitação. Nesse sentido enquadram-se, por exemplo, coleções que a criança faz em função do irmão ou amigo ter iniciado a sua. Tal tipologia de coleção possui caráter passageiro.
2) Coleção como atividade auto-atribuída: em que um desejo pessoal se manifesta, faz sentido com a sua personalidade e se estabelece inclusive para caracterizar uma diferenciação do indivíduo frente a grupos sociais. Seria o caso de um jovem que encara determinada coleção como algo enriquecedor à sua formação ou que esta possa expressar valores positivos. Dado o caráter de sentido pessoal, tal comportamento revela-se duradouro e, mesmo a coleção tendo fisicamente desaparecido, pode ser retomada mediante novos estímulos.
3) Colecionismo social: consiste na coleção de objetos mediante coerção de grupos sociais. Nesse caso, a atividade se dá com pressão social e age como "condição" para o indivíduo ser aceito; caso de um bebedor de vinho que, para ser aceito no clube de degustadores, precisa demonstrar que tem sua coleção; ou então o menino que, para sair com a turma, precisa mostrar sua coleção de figurinhas. A transitoriedade da coleção está diretamente ligada à permanência do indivíduo no respectivo grupo social, a partir do que poderá mantê-la em função desta ter também caráter auto-atribuído.

      Reportando à recreação, Jerome Davis distinguiu três categorias principais: a espontânea, a de organização comunitária e a motivação comercial. A primeira incluiria as atividades recreativas particulares do indivíduo, como hobbies; a segunda seriam atividades culturais sem fins lucrativos, como esporte amador; a terceira, ações oferecidas por empresas, abordagem principal deste artigo.
      As tipologias apresentadas não esgotam o assunto, existindo outras motivações e impulsos que mobilizam pessoas a colecionar quase todos os tipos de objetos. Uma simples consulta pela Internet (21/10/97), no site "Cadê", possibilitou várias entradas para o assunto: "Estudo e intercâmbio entre colecionadores de conchas"; "Selos, cédulas, moedas, cartões postais e telefônicos"; "Associação Brasileira dos Colecionadores de Armas"; "Automóveis Antigos"; "Orquídeas"; "Camisas de futebol"; "Colecionadores de Latas de Cerveja"; "Página do Filatelista".
      Mostram-se como motivadores do colecionismo fatores como apego a valores culturais (coleção de artes), valores históricos (coleção de documentos antigos), científicos (coleção de borboletas), profissionais (coleção de CDs), intelectuais (coleção de livros), consumistas (coleção de perfume), comportamentais (coleção de papel de carta), econômicos (coleção de automóvel), associativos (coleção de selos), sentimentais (coleção de bichinhos), familiares (coleção de fotos), lúdicos (coleção de bola de gude) e outros.
      Com tantas motivações e relevância para as pessoas, o colecionismo sempre encontrou espaço na sociedade. Porém, o que parece estar ocorrendo, é um aperfeiçoamento do marketing para aproveitar melhor as oportunidades que tal comportamento está oferecendo às empresas.
      Portanto, o objetivo é relatar a configuração do colecionismo, analisando algumas implicações mercadológicas e publicitárias que tal atividade acarreta
      A atitude colecionista não pertence com exclusividade a qualquer campo do conhecimento das ciências, predominando os estudos na área de psicologia e, em menor escala, sociologia, antropologia, pedagogia e outros tantos, inclusive marketing e comunicação. Segundo Koenig, "No final do século XIX, no entanto, com o desenvolvimento da Antropologia, Sociologia e Psicologia, a recreação começou a ser estudada sistematicamente como um aspecto importante do comportamento humano".
      Sumner e Keller argumentam que as atividades recreativas não tomaram a forma de instituições de "autopreservação" e "autoperpetuação" societária, compreendendo, por assim dizer, o aspecto mais leve, ou mais alegre, das últimas. "Embora as atividades recreativas, em geral, sejam encontradas em toda parte, elas apenas assumem um significado maior quando a sociedade atingiu um estágio de desenvolvimento em que a luta pela vida não é incessante e se dispõe de tempo de lazer".
      Os referenciais teóricos mais direcionados ao objeto deste atigo são raros. Apurou-se abordagens direcionadas ao tema nos estudos de Osborne, Harris, Hurlock, Pfromme Hattwick, relacionando o colecionismo ao comportamento infantil e adolescente. Koenig contribui com uma análise sociológica da recreação, em que se contextualiza o hobby e comportamento lúdico das pessoas, inclusive com uma abordagem histórica desse processo. Foram mais raros ainda os estudos de marketing nessa área, ressaltando os trabalhos de Schudson e Packard; essea autores, na verdade, reconhecem o colecionismo como uma "mania" da sociedade de consumo que, por sua vez, torna-se vítima dos procedimentos das empresas que utilizam tal recurso para promover o consumismo.
      A abordagem técnica do assunto encontrou algumas referências em Kotler e artigos de periódicos, estes trazendo experiências e casos mercadológicos em que as variantes colecionistas estiveram presentes nas estratégias de empresas.

       Colecionismo

      O ato de colecionar sempre esteve presente no comportamento humano, revestindo-se para alguns como uma forma de hobby, e mania para outros. Os conceitos registram amplitudes diversas, passando de teores leves e informais, como considerá-lo um tipo de entretenimento e passatempo descompromissado, até teores pesados, identificando-o como obsessão ou neurose.
      Preferindo enquadrar como atividade de caráter formativo da personalidade, Osborne atribui à idade infantil (7 anos) o início de um comportamento colecionador:

      "Muitas vezes, os passatempos estão associados a coleções. O ato de colecionar é, frequentemente, o que atrai as crianças, e mais uma vez não nos devemos decepcionar se ele não conduzir a estudo mais sério dos materiais envolvidos... Nesses casos elas podem ser incentivadas a fazer mais contatos sociais, participando de trocas de objetos, comparando coleções, etc. Sem dúvida, atividades que levam a criança a construir e colecionar podem ter grandes vantagens educacionais, mas ainda é importante para a criança ter válvulas de escape de tipo mais completamente criativo - pintura, desenho, modelagem etc.

      A partir dos onze anos, início da puberdade, a individualidade se expressa também pelo desenvolvimento de atividades recreativas, caso de passatempos e hobbies. Colecionar seria um exemplo. Na idade de onze anos, significa apenas guardar coisas: "A mãe se desespera ao descobrir os bolsos do filho repletos de toda espécie de lixo - pedras coloridas, passagens de ônibus, toco de lápis, uma moeda estrangeira, uma concha e os mais variados objetos. E se ele tem um quarto só para si, provavelmente haverá ali álbuns de selo, ou de figurinhas, gavetas com insetos mortos, cadernos cheios de números de trens ou ônibus"
      Segundo a mesma autora, para a criança, no entanto, estas coisas possuem significado. Talvez seja um meio de conservar fragmentos de experiências, lembranças, da mesma forma que os adultos se apóiam em seus fragmentos de arte, literatura, ciência etc. Pode também usar esse hábito como meio de fazer contatos - trocará figurinhas, selos, e encontrará amigos. Considera que: "Mais tarde, colecionar pode evoluir para um procedimento mais racional, isto é, pode ser um meio de obter lucros ou de organizar conhecimentos, ou de adquirir reputação de perito em algum assunto."
      Referindo-se aos adolescentes, Elizabeth Hurlock apresenta hobbies como forma de lazer e que tendem a ser persistentes. Estaria ligado a um relaxamento agradável, uma recreação. A escolha do que fazer é sua e o tempo e esforço que dedica são voluntários. Quando o interesse diminui, ele não sente compulsão para prosseguir, nem culpa por deixá-la.
      Para que uma atividade recreativa se transforme em hobby, ela precisa dar prazer ao adolescente e satisfazer suas necessidades, de modo que volte a ela sempre que sentir vontade de lazer e relaxamento. "Os estudos sobre os hobbies dos adolescentes revelam que a maioria se enquadra em duas categorias gerais: construções e coleções".
      Nas atividades de "construções" constariam fazer coisas, apenas por prazer. Estudos mostram que os meninos gostam de construir ou remodelar automóveis, bicicletas, aparelhos elétricos, barcos etc.
      Segundo a autora, "Colecionar grandes quantidades de praticamente qualquer coisa é um hobby predileto das crianças. Os adolescentes, porém, colecionam somente aquilo que se relaciona de perto a seus interesses escolares e sociais ou que tenha prestígio perante o grupo de amigos."
      Sem levar em conta modismos, certas coisas são colecionadas quase que universalmente, como fotografias, recortes de jornais, discos, cartas, distintivos, revistas, bijuteria, lembranças de festas, artigos para embelezar. "O interesse em colecionar geralmente atinge um pico entre 9 e 13 anos, que são os anos da pré-puberdade e puberdade, quando o desejo de solidão é forte. Depois de as mudanças puberais estarem completas e quando o jovem adolescente se sente fisicamente melhor, seu interesse pelas atividades dos amigos aumenta e o interesse em colecionar diminui".
      Antonio Candido retrata três grupos de adolescentes escolares: "recreativos ou lúdicos", "intelectuais (estudar)", "cooperativos (atividades em comum)". A partir da classificação apresentada é possível entender, por exemplo, porque o ato de colecionar não recebe a adesão de todos, mas quando persiste, pode passar para a fase adulta assumindo outros significados. Foi na pré-adolescência que Pedro Corrêa do Lago começou sua coleção, reunindo documentos velhos: "Ele transformou seu hobby em vocação: aos 12 anos começou a colecionar documentos e cartas quase de brincadeira ... Hoje, possui a maior coleção de documentos antigos do Brasil, é o representante da bicentenária Sotheby’s ..." Com 34 anos atualmente, possui 20 mil documentos históricos, 60 mil títulos e 15 mil gravuras.
      Hattwick e Gil, a seguir, tentam abordar a questão do ponto de vista behaviorista. Embora a classificação sugerida não possa receber concordância plena, constitui-se como uma das poucas tentativas de reflexão sobre a relação motivacional com o colecionismo.
      Hattwick considera que há os desejos "originais", quase inatos, que se desenvolvem nos indivíduos de forma independente de fatores culturais e sociais. Tendem a ser satisfeitos mais rapidamente dado seu caráter mais urgente. Encaixariam-se nessa categoria: Alimentos e Bebidas; Comodidade; Atrair o sexo oposto; Bem-estar dos seres queridos; Proteção quanto ao temores e perigos; Ser superior; Prestígio Social e Viver mais tempo. Evidente que essas categorias são vagas; mas se fossem consideradas, a motivação de colecionar estaria ligada, por exemplo, a Ser Superior - caso de se fazer uma coleção de carros luxuosos - ou angariar Prestígio Social - colecionar obras de arte -, podendo-se inferir, por esse conceito, que o colecionismo reporta-se a desejos "originais" ou primários.
      De outro lado, podem também estar presentes nos chamados "desejos secundários":

      "Os desejos secundários são aprendidos, adquiridos e desenvolvidos. Aparecem em nós a medida que vamos crescendo, ganhando experiência e consciência da nossa posição na coletividade. Para anunciar certos produtos e serviços, apelar a estes desejos secundários podemos ser muito eficazes. Mas aos desejos secundários não se chega tão rapidamente como os básicos, já que enquanto estes parecem ser inerentes a nós, os secundários são adquiridos e têm menor força. Por isso seriam menos eficazes do ponto de vista publicitário."

      Esta conceituação encontra certa concordância com Gill, que prefere denominar "hábitos" como comportamentos aprendidos, portanto não hereditários, formando-se a partir do caráter e da personalidade.
      O psicóloco C.N.Allen, acrescenta que, à medida que se desenvolve a cultura, produz-se um número maior de desejos secundários. "Uma variação em nossas normas de cultura efetará a estes desejos e a sua efetividade, porque ambos são relativos e dependem de muitos fatores instáveis." Hattwick designa nove desejos adquiridos-secundários, incluindo "Possuir Objetos":

      O apego aos "objetos" é um dos mais antigos apelos utilizados pela publicidade. Praticamente todo anunciante já utilizou em um momento ou outro; alguns mais que outros. O interesse por "objetos" parece estar relacionado com o grande interesse por colecionar que muitas pessoas têm. Esta necessidade de colecionar coisas, que ocorre com crianças, manifesta-se também no adultos na atitude de conseguir algo por nada que alguns adotam.

      Avalia que é possível provocar os impulsos apelando-se aos "desejos", ao qual o indivíduo busca satisfazê-lo. Seria o caso de um anúncio (sugestão) que age no impulso de colecionar (desejo), motivando a aquisição do produto.
      Kotler tenta abordar estas questões tomando como base os modelos da aprendizagem, psicanalístico e sociológico.
      Segundo o Modelo da Aprendizagem, os impulsos classificariam em primários (como fome, sede, sexo) e impulsos apreendidos (como medo, orgulho). Os últimos seriam aprendidos por meio da experiência em tentar satisfazer os impulsos primários. Um impulso é um forte estímulo interno que leva à ação. Um impulso torna-se um motivo quando dirigido a um objeto específico: "Uma pessoa poderá tomar um refresco para satisfazer sua sede ou um bombom para satisfazer sua fome. Esses objetos são estímulos no sentido de que são capazes de excitar e satisfazer seus impulsos." Sugestões são estímulos menores que determinam a forma como será satisfeito algo: "Ao satisfazer a sede, a pessoa está sugestionada pela hora do dia, o custo e a disponibilidade das diferentes bebidas e assim por diante".
      No Modelo Psicanalítico, as necessidades do homem operam em vários níveis de consciência que não são observadas a priori, pois são internas. A implicação mais importante de marketing nesse modelo é de que os compradores são motivados tanto por aspectos simbólicos como funcionais do produto.
      O Modelo Sociológico postula que as necessidades e o comportamento do homem são fortemente moldados pelas forças sociais, caso da cultura, classes sociais e grupos de referência. Seguindo esta linha, Schudson considera importante a figura do "heavy user", grupos que concentram maior intensidade de uso/consumo de certos produtos, podendo representar contingentes de colecionadores "fanáticos" e que formam acervos de grande dimensão. Avalia também o comportamento do consumidor afluente, pertencente a referenciais de família de alto poder aquisitivo possuindo, no caso, recursos para formar e incrementar coleções, inclusive com importação de componentes. Tal postura também reforça o ato de colecionar ser uma maneira de inserção e código social.
      Schudson avalia ainda o processo de "possuir bens" ligado à cultura de consumo, que se preocupa mais em ter e comprar coisas do que ver a pertinência do que é consumido. O ato de possuir bens adquire uma relação simbólica das pessoas com os objetos, supervalorizando produtos, alguns desnecessários, algo que recebe o engajamento da publicidade.
      Segundo Gill, no desejo pela Propriedade, "O impulso que nos leva a reunir, juntar dinheiro, ou arrematar qualquer classe de objetos é muito poderoso na natureza humana. O armazenamento e preservação de alimentos e outras mercadorias essenciais formou parte essencial da luta do homem primitivo pela sobrevivência."
      Aponta também o motivo da Aquisição:

      O elemento aquisitivo, em nossa formação de seres humanos, está expressado também de outras maneiras distintas. O navegante que colecionava todo tipo de conchas marinhas e as pregava nas paredes exteriores de sua casa, é um exemplo. O hobby colecionista não é insólito de forma alguma. A maioria de nós tem nossa coleção de algo. Pode ser de um valor intrínseco insignificante: diários velhos, recortes de revistas ou qualquer outro tipo de coleção. É possível que nossa mania de colecionar não tenha outro propósito que a satisfação de nos proporcinar a satisfazer um capricho ... Claro está que existem numerosas colecões que brindam um amplo e proveitoso mercado de negócios, e estas são, com frequência, objeto de publicidade. As coleções de móveis antigos, objetos de prata, louça, cerâmica, moedas, jóias, selos postais etc., são hobbies deliciosos que se prestam a realizar proveitosos negócios.

      O colecionismo como negócio, embora claramente relacionado com o fator econômico, contempla ainda fatores comportamentais e sociais, sempre reportando a uma vontade ou gosto, servindo muitas vezes de realização pessoal. É o caso do Chevrolet Clube do Brasil; fundado em 1985, conta com muitos modelos de carros antigos produzidos pela General Motors americana, cado do Bel Air, Buick, Cadillac, Camaro, Impala, Independence e Phaeton. Os colecionadores costumam reunir-se periodicamente, participam de eventos e passeios com os automóveis antigos.

      O colecionismo como motivação para o marketing

      Não há registros históricos formalizando a incorporação do colecionismo como motivação trabalhada pelo marketing.
      Vance Packard relatou que, em 1955, empresas americanas já haviam detectado o potencial de consumo face às manias e modismos. Relata a mania por Davy Crockett, em 1955, que motivou o aparecimento de 300 produtos Davy Crockett, rendendo 300 milhões de dólares.

      Os vendedores americanos sentiram necessidade de conhecimentos mais profundos sobre esse fenômeno das manias, para que pudessem, não apenas partilhar dos lucros, mas também saber quando afastar-se do negócio. Era necessária pesquisa para ajudar os fabricantes a evitar a superestimação do período da mania...

      Esse fenômeno chamou a atenção de especialistas em motivação, como o Dr. Dichter e Alfred Politz. Estudando a "mania" por Crockett, concluíram que era resultante de três fatores: símbolos, veículo e capacidade de satisfazer uma necessidade subconsciente. No caso analisado, o "veículo" era a canção "Balada de Davy Crockett", que se repetia em todo programa de Disney. Tinha muitos "símbolos", como boné de peles, franjas de couro, fuzil antigo. No que se referia a "satisfazer necessidade subconsciente", o Dr. Dichter disse a respeito de Crockett: "As crianças estão procurando oportunidade de explicar-se em termos das tradições dos pais. Crockett ofereceu-lhes esta oportunidade. Em plano muito imaginativo, os garotos sentiram realmente que eram Davy Crockett...".
      O autor, citando Politz, observa que as manias seguem curso do mais alto para o mais baixo, principalmente no caso de adultos, como por exemplo, dos grupos de maior poder aquisitivo e grau escolar para os de menor poder e grau educacional . No caso das crianças, Politz explica: "As crianças que são líderes devido à sua idade, adotam em primeiro lugar a mania e, depois, vêem sua adoção por crianças menores, de um grupo de idade com o qual elas não desejam mais identificar-se. Isso faz com que as crianças mais idosas abandonem deliberadamente a mania."
      Evidente que são avaliações contextualizadas no modelo motivacional, que podem ser contestadas, por exemplo, quando se contextualiza o mesmo fenômeno no modelo sociológico. Nesse sentido, o comportamento colecionador não teria necessariamente hierarquizações quanto à renda ou escolaridade, mas de acordo com a relação do indivíduo com os grupos sociais. São inúmeros os "clubes" ou entidades de colecionadores que se formam por afinidade social, caso de colecionadores de armas, automóveis, bebidas etc.
      A marca Zippo, já nos anos cinquenta, era referência de isqueiros, fazendo parte do comportamento dos jovens fumantes da época. De outro lado, após os anos oitenta, viu-se o consumo ou demanda por cigarros diminuir, enquanto as vendas do Zippo aumentavam ano após ano. De 1988 a 1994, as vendas de Zippo dobraram. Uma das pesquisas empreendidas pela empresa "Zipo Manufacturing Co" apurou que, hoje, mais de 30% dos seus clientes são colecionadores. "Assim, e a partir de um competente programa da Database Marketing com seu Trade, todos os anos lança uma nova coleção. E nas datas comemorativas, produz edições especiais. Na comemoração dos cinquenta anos do Dia D, junho/1994, por exemplo, produziu uma série referente à efeméride. Vendeu ... em todo mundo 450.000 unidades."
      Segundo Politz e Dichter, é possível prever o curso das manias e também criá-las de fato, notadamente quando da localização de necessidade insatisfeita dos jovens em torno dela. Profetizando, Politz afirmou que "... os peritos em pesquisa podiam sem dúvida alguma estabelecer as regras gerais para a criação de uma mania bem sucedida ... uma vez estabelecidas as regras gerais, tornar-se-ía necessário o toque ‘criador’. Tanto ele como Dichter concordaram em que essa desafiadora tarefa do futuro - criar manias de grande magnitude para nossas crianças - será trabalho conjunto do pesquisador e do homem criador."
      Realmente, constata-se hoje em dia, que o marketing tem capitalizado a motivação colecionista para incentivar vendas e conquistar mercados. Nota-se o incremento de coleções junto a diferentes empresas, notadamente as que estão voltadas para bens de consumo não duráveis e, principalmente, alimentos, destacando-se o público infantil. Tal procedimento apóia-se em muitos pontos: 1) Vendas: a venda do produto é maior quando se agrega valor a este; 2) Fidelização: a identificação do colecionador com a empresa é imediata, pois mostra sintonia com seus desejos e motivações; 3) Propaganda boca-a-boca: a aceitação da coleção pelo grupo social se faz sentir na divulgação pessoal e "coercitiva", nesse caso, quem não colecionar está "por fora"; ao divulgar a coleção, estará divulgando a empresa ou produto, quer de forma integral, quer de maneira simbólica; 4) Recall da marca: fixa a marca junto ao colecionador e a um contingente próximo a ele, caso de familiares e amigos; 5) Socializa o produto: o produto é reconhecido não apenas como algo a ser consumido, mas também por se integrar no dia-a-dia da escola, família, brincadeiras etc.
      Considera-se que o ato de colecionar tem raízes no próprio comportamento humano, quer seja em termos de desejos primários ou secundários. As pessoas desejam, a todo momento, produtos, serviços de vários tipos, desde cadeira para sentar até energia elétrica para tomar banho. O marketing, por ser uma atividade empresarial/institucional, dificilmente interfere nesses níveis de necessidade, o mesmo ocorrendo quanto a necessidade ou desejo de colecionar. Nesse sentido, estaria latente em muitas pessoas o desejo de colecionar; o que estaria sendo processado psicologicamente é a forma como será canalizado esse desejo, momento que o marketing encontra campo de ação, oferecendo estímulos.
      Paulo Leone, da agência McCann Erickson-SP, relata que "o consumidor procura o produto e é procurado pela marca". Ou seja, o marketing e a publicidade podem interferir na opção da marca, mas dificilmente pode condicionar o objeto de consumo desejado (produto). No mesmo evento, Elza Ivo afirmou que a cerveja "é commodity", ou seja quem deseja tomar uma cerveja pode fazê-lo por meio da marca, mas se esta não está disponível ou apresenta-se inadequada, toma de outra marca. Este argumento se detém no fato de que as vendas do produto dependem da produção e respectiva distribuição. Ou seja, dificilmente alguém vai tomar uma cerveja quente de determinada marca, por mais intenso que tenha sido o esforço mercadológico dessa empresa.
      Segundo o conceito utilizado por Kotler, o marketing precisa planejar vários fatores para conseguir encaixar o produto nas necessidades e desejos do consumidor, resumindo nos itens Produto, Preço, Praça e Promoção e respectivo posicionamento mercadológico. Assim, uma coleção deve ser trabalhada tendo em vista a elaboração do produto alvo da coleção, preço/oferta, distribuição e promoção, que poderia ser em termos de embalagem e publicidade, por exemplo. O posicionamento se refere ao contexto de mercado, em que a definição do público é fundamental. No caso das coleções, o marketing tem se dedicado mais às crianças e adolescentes, pelas motivações já assinaladas.
      Os adolescentes possuem um comportamento colecionador acentuado. Packard menciona que a revista "Life" pesquisou os hábitos de gasto dos adolescentes e concluiu que eles se estavam cercando de "uma fantástica coleção de bugigangas e diversões extravagantes e frequentemente caras", inclusive um milhão e quinhentos mil automóveis e vinte milhões de dólares de batom".
      A revista "Capricho" tem publicado uma série de seções em que comenta o dia-a-dia de pessoas e artistas, inclusive hábitos de vida. Na edição de outubro de 1997 retratou a adolescente Caroline, 14 anos, e seu hobby de colecionar miniaturas Kinder ovo. Segundo a revista,

      Caroline guarda os ovos Kinder desde 1994 e é uma das maiores colecionadoras do país. Tem por volta de 1.500 peças e mais de 500 repetidas (o maior colecionador do mundo mora na Hungria e tem mais de 7000 peças) ... A coleção começou para valer quando, em 1995, ela comprou uma caixa com 144 ovinhos. Daí para frente só parou de comer porque enjoou, e hoje seu irmão se encarrega da parte engordativa do negócio. Caroline compra sempre caixas e tem contato com fabricantes em outros países. Além disso, troca Kinder com pessoas do mundo inteiro e tem paixão pela coleções estrangeiras. Conseguiu com esses intercâmbios conhecer gente diferente e ter miniaturas para exibir que nunca ninguém viu ...

      Porém, é no público infantil que se concentram as ações do marketing. Pesquisa realizada pela Marplan com amostra de 773 pré-adolescentes (de 10 a 14 anos) de ambos os sexos e todas as classes socioeconômicas, na Grande São Paulo, em 1995, apurou que 33% tem como divertimento "colecionar figurinhas", destacando-se os meninos, que totalizam 66% deste contingente. As meninas se interessam por outros produtos, como bonecas: "A cada segundo, no mundo, são vendidas duas Barbies. A menina americana média possui sete."
      A Coca-Cola, em 1988, lançou a promoção em que 105 tampinhas carimbadas possibilitavam a troca por miniatura de engradado, contendo seis garrafinhas com a marca Coca-Cola impressa na língua de seis países diferentes. Com isso, a empresa aumentou em 17% suas vendas. Foram confeccionadas sete milhões de miniaturas. "Colecionadores procuraram selos e tampinhas até no lixo" é o título de um pequeno artigo do jornal Folha de S.Paulo, que mostra uma sequência de crianças participantes da promoção: "O menino Guilherme Solcari exibe animadamente a sua coleção de mini-cokes, uma promoção publicitária que virou mania entre a garotada de São Paulo ... Rodrigo Fonseca toma mais um refrigerante para aumentar sua coleção ..." A campanha não só incentivou o consumo, às vezes exagerado das crianças, como também mudou o hábito de consumo de algumas delas, caso de Rodrigo Pinheiro Fonseca, 8 anos, que não tomava o produto por considerá-lo americano. A estratégia de oferecer coleções tem sido praticada pela empresa de cinco em cinco anos; neste ano, a Coca-Cola lançou a promoção envolvendo coleção de mini-caminhões históricos.
      Para reverter a tendência de queda nas vendas no setor, agravada pela concorrência dos importados a a partir de 1995, a Glasslite incrementou as coleções de super-heróis de seriados da TV, como Rambo, Tartarugas Ninja, Cavaleiros do Zodíaco, Super Equipe de Solbrain, entre outros, todos acompanhados de acessórios. As avaliações dão conta que 80% da produção da empresa é dedicada, hoje em dia, a esses produtos, dirigidos a meninos entre 3 a 8 anos de idade. "Vendemos fantasia, justifica o chefe de marketing da Glasslite, Minoru Wakabayashi, acrescentando que esse mercado vive de lançamentos e tem muito o que crescer, pois é próprio dos meninos nessa faixa etária se projetarem em heróis."
      A dupla "Bananas de Pijamas", dos gêmeos B1 e B2, foi criada em 1992 pela emissora australiana ABC, programa este que passou a ser transmitido em 24 países, inclusive no Brasil. Aqui propiciou o franqueamento de produtos, que fazem parte da coleção de muitas crianças. "Quando começa a musiquinha de abertura, a Nathalia sai correndo para ver. Já compramos muitos produtos da dupla", relata Renata Rochou, 33 anos, mãe da menina de 1 ano e oito meses. São bonequinhos, mamadeiras, bóias, porta-pijamas, roupas estilizadas com a dupla. "A Maritel fabricou 130 mil bonequinhos, compramos 33 mil e vendemos tudo", declara Marcelo Roffé, gerente da área de compra de brinquedos das Lojas Americanas. Quarenta empresas estão licenciadas e, até o fim de 1997, cem produtos estarão no mercado, entre escovas de dente, triciclos, lancheiras e vídeos, gerando faturamento de 40 milhões de dólares.
      Presente no mercado brasileiro desde 1994, a Ferrero, empresa italiana, começou a ser conhecida do público infantil brasileiro com o lançamento do Kinder Ovo: ovo de chocolate com brinquedos dentro. Segundo artigo publicado na revista "Veja":

      O segredo é que a Ferrero não vende ovos de chocolate. Ela descobriu um ovo de Colombo e vende uma idéia. Os seus ovinhos são recheados com brinquedos desmontados instalados em pequenas cápsulas de plástico. É uma versão moderna das balas-surpresa de trinta anos atrás, que traziam no pacote figurinhas de jogadores de futebol e anéis de fantasia. Pega as crianças pela mania de colecionar e pela surpresa. (Os ovos trazem 150 tipos de miniatura diferentes).

      O mesmo artigo informa que "Os bonecos de chumbo, mais raros, são considerados mais valiosos e por isso são disputados pelos colecionadores. Resultado: a Ferrero criou uma nova mania. Há até clubes de colecionadores das miniaturas Kinder ... Diariamente são vendidos quase 5 milhões de ovinhos Kinder no mundo." Renata Antonievicz, uma estudante de Curitiba de 12 anos, que tem mais de setenta miniaturas, relata: "Experimentei e gostei do chocolate e agora estou guardando os bonequinhos"... "Primeiro eu monto o bonequinho e depois como o chocolate", diz sua colega Melina Amaro da Luz, da mesma idade, que coleciona sessenta brindes.
      A Elma Chips introduziu nos seus produtos figurinhas especiais denominadas "Tazo". Especiais porque são disponibilizadas em várias categorias, como "Tazo", "Super Tazo", "Mega Tazo" e "Hiper Tazo", que por sua vez possuem diferentes categorias (40 tipos no "Hiper Tazo" e 20 tipos nas demais). Alguns modelos possuem acabamento aluminizado, outros possuem textura que, conforme o movimento, muda a imagem.
      Com tantos atrativos, a criançada adotou a "Tazo mania" e hoje é difícil encontrar uma criança que não colecione ou que não saiba da moda. A adesão foi tamanha que algumas escolas proibiram que seus alunos fizessem circular as estampas. Procedimento que não foi seguido pelo Colégio Educare de Curvelo, de Minas Gerais. Nessa escola, as figurinhas foram incluídas em exercícios de matemática. Segundo a supervisora do Colégio, "Achei que seria divertido e proveitoso insinar as quatro operações com eles", tendo sido observado um aumento no rendimento de 70% para 90%. Na Escola Estadual Doutor Francisco Edmídio Pereira Neto, a professora Margarete Angeli Bartotti resolveu ensinar números inteiros na 6ª série com um jogo de tazos, obtendo compreensão e interesse maior pela matéria.
      No Brasil, a empresa investiu 7 milhões de dólares em torno da campanha em 1997, que inclui amostragem em escolas, parques, clubes e material nos pontos-de-venda, com o objetivo de aumentar as vendas em 50%.
      Se é na escola, família e amigos que a pressão colecionadora adquire força, a comunicação é, muitas vezes, o processo iniciador e sedutor. Segundo o diretor de marketing da Suchard (refrescos), Timothy Altafer: "A decisão de compra por parte da criança se dá no ponto-de-venda. Por isso, as embalagens devem ter grande apelo de cores".
      Numa pesquisa exploratória junto a um único supermercado da cidade de São Paulo (Carrefour, Imigrantes), realizada em 16/10/97, observou-se produtos que estavam promovendo coleções. A quase totalidade se dirigia a crianças e, uma parcela menor, a adolescentes e mulheres (receitas). Seis produtos representativos foram analisados:
      1) Empresa: Grain Mills Cereais
      Produto/Marca: Sucrilhos/Croc’in Rock
      Coleção Warner
      Texto: "Recorte e monte: siga a tesoura e recorte seu personagem, depois basta colar e encaixar a base. Você pode trocar com seus amigos e montar sua coleção Warner. Invente e divirta-se."
      Público principal: Criança
      2) Empresa: Santista Alimentos S.A.
      Produto/Marca: Gelatina Sol, Turma da Mônica
      Texto: "Colecione o jogo da Memória". Trata-se de jogo composto por personagens da Turma da Mônica. Cada pacote traz duas figuras iguais para o jogo.
      Público principal: criança/adolescente
      3) Empresa: Neslé
      Produto/Marca: Sucrilhos/Magic
      Texto: "Nova coleção". "Alguns dos 24 brinquedos da coleção Nestlé Magic". Brinquedos ligados ao filme Hércules, da Disney’s.
      Público principal: Criança
      4) Empresa: Nutrifoods
      Produto/Marca: Sucrilhos/Turma da Mônica
      Texto: "A Nutrifoods trouxe a cidade da Mônica pra você colecionar e brincar a vontade. Tem escolinha, barraquinha de frutas, porquinho, a turminha toda e muito mais. Pra montar e brincar é só começar."
      Público principal: Criança.
      5) Empresa: Nestlé
      Produto/Marca: Chocolate/Turma da Mônica
      Texto: "Nesta embalagem você vai encontrar um cartão colorido com os personagens da Turma da Mônica numa situação divertidíssima. No total são 20 cartões diferentes que você pode colecionar, brincar e enviar para seus amigos."
      Público principal: Criança
      6) Empresa: Nestlé
      Produto/Marca: Chocolate/Surpresa
      Texto: "Coleção Viagem Espacial. Ganhe o álbum e colecione super figurinhas especiais! Embarque com Surpresa nessa viagem inesquecível e colecione 6 figurinhas adesivas com efeitos especiais e 24 super figurinhas do espaço."
      Público principal: Criança.
      Estes casos mostraram alguns indicadores mercadológicos: 1) As coleções dirigem-se às crianças, ou como público final ou como agente comprador, já que sua presença no ponto-de-venda é canalizada para a aquisição do produto quando da oferta da coleção; 2) Predominam os produtos alimentícios; 3) A coleção possui como "veículo" personagens, heróis, modelos conhecidos da criança; 4) Procura estabelecer um contato físico com o produto: para tomar posse da coleção, a criança precisa recortar, abrir a embalagem, enfim, envolver-se; 5) Incorporam linguagem visual e escrita apropriada à criança, com tipologia grande e fantasia, além de desenhos estilizados; 6) A proposta é no sentido de vender a coleção como fator de divertimento; 7) A coleção está sempre revestida com um caráter lúdico e funcional, quer seja para jogar, brincar, reunir etc.
      A promoção pela embalagem configura-se como elemento de marketing não apenas direcionado à disponibilização da coleção à criança, mas também como veículo informativo e persuasivo, em que as cores, formas, figuras, marcas e texto interagem no ponto-de-venda. A embalagem é também reconhecida pela criança uma vez que incorpora os mesmos recursos estéticos anunciados na publicidade.
      O reconhecimento de que a influência publicitária no ato de colecionar dá-se de forma mais intensa junto ao público infantil está mais ligado à formatação mercadológica da oferta do que propriamente à ação publicitária. Mesmo assim, constata-se que o discurso publicitário está bastante sintonizado com a linguagem infantil, promovendo plena identidade com o produto e a coleção em si. É importante considerar que o trabalho da propaganda deve participar de um composto de comunicação, quando muitas vezes sua função é mais no sentido de dar o "start" para a coleção do que motivá-la junto às crianças. Ou seja, caberia aos amigos e familiares motivarem a criança a colecionar produtos relacionados a marcas comerciais, ficando a publicidade como elemento iniciador deste processo. Caberia ainda à publicidade, tendo a criança já dado início à coleção, gratificá-la com o anúncio, motivando-a a continuar .
      Com a finalidade de colher outros indicadores sobre a questão, empreendeu-se pesquisa exploratória sobre comerciais veiculados na cidade de São Paulo, na semana de 13 a 24 de outubro de 1997, nas emissoras Globo, SBT e Manchete. O período foi posterior ao dia da criança, para não caracterizar um viés na captação dos comerciais. A televisão foi escolhida em função do público e da opção dos anunciantes para este meio (as revistas infantis seriam outra alternativa).
      No período, selecionou-se apenas os comerciais dirigidos às crianças, alguns em que constasse menção ao ato de colecionar, obtendo-se o seguinte material:
      1) Empresa/Produto: "Estrela". Coleção Jurassic Park
      Narrativa: "Estávamos caçando dinossauro, mas nos tornamos a caça". Off: "O mundo perdido Jurassic Park. Agora você vai dominar aqueles que dominaram a Terra há milhões de anos atrás. Alguma coisa sobreviveu. Você sobreviverá? Viva essa emoção com a coleção O Mundo Perdido Jurassic Park. O Mundo Perdido Jurassic Park da Estrela. Quem não correr está perdido!"
      Imagem: Miniaturas de plástico (dinossauros e outros animais pré-históricos) ameaçam e são atingidos por bonequinhos (caçadores) e suas armas, acompanhados por cenas do filme "Jurassic Park", de Steven Spilberg.
      Objetos da coleção: Miniaturas representativas de animais pré-históricos e bonequinhos representando caçadores e aventureiros.
      2) Empresa/Produto: "Elma Chips". Salgadinhos de várias marcas.
      Narrativa: "Você mexe e eles mudam. Procure o seu nos salgadinhos Elma Chips."
      Imagem: Quatro meninos jogando figurinhas do Tazo. Há o enquadramento em uma pilha de figurinhas e efeito especial com os bichinhos que são estampados na coleção.
      Objetos da coleção: figurinhas Tazo.
      3) Empresa/Produto: "Samtoy". Coleção Power Rangers
      Narrativa: "Depois dos meteoros, a civilização desapareceu. Surgiram os animais do mundo perdido. Seu instinto obrigou a lutarem entre si. Vertigo, Caos, Calon, Brissard, Diablo. Figuras de ação Power Rangers da Samtoy. Colecione!"
      Imagem: Refere-se aos objetos da coleção em cenas de luta, ou seja, os personagens assinalados na narrativa contra os animais pré-históricos.
      Objetos da coleção: Bonequinhos de plástico representando os personagens da Coleção.
      4) Empresa/Produto: "McDonald’s". Lanches.
      Narrativa: "O McLanche Feliz desse mês convida você para um delicioso e divertido acampamento com o Ronald McDonald e a sua turma. A surpresa traz o kit camping para você colecionar. Peça o seu McLanche Feliz, o hamburg ou X burg ou MacNuggets. Peça seu MacLanche Feliz, sempre uma surpresa diferente."
       Imagem: Apresenta o personagem Ronald McDonald tentando montar uma barraca de camping, após o que surge também sua turma brincando no ambiente.
      Objetos da coleção: objetos de plástico que fazem parte do kit: porta-lanche, garrafinha com boca especial e pequenos talheres (faca, garfo e colher).
      5) Empresa/Produto: "Coca-Cola". Refrigerante.
      Narrativa: "Chegou a coleção mini-caminhões Coca-Cola. Junte 10 pontos e troque por um mini-caminhão histórico. Os pontos estão marcados nas tampinhas e nos copos. São cinco modelos diferentes pra você colecionar. Coleção mini-caminhões Coca-Cola: uma história com sabor inesquecível!"
      Imagem: Mostra três crianças (dois meninos e uma menina) invadindo o interior de um caminhão da Coca-Cola, aproveitando a ausência do entregador. Em seguida, um deles bebe o produto, passando assim a visualizar algo semelhante a uma fábrica, em que há o engarrafamento da Coca-Cola, confecção das tampinhas marcadas, e os próprios mini-caminhões na esteira, já montados. Ao final, o entregador descobre os meninos dentro do caminhão e troca uma garrafa de Coca-Cola (em suas mãos) por um mini-caminhão dado pela menina. Há um texto ainda que informa a validade da promoção de 15/10/97 a 30/10/97 para as marcas: Coca-Cola, Coca-Cola Light, Sherry, Taí, Fanta e Sprite.
      Objeto da Coleção: Cinco mini-caminhões antigos da Coca-Cola.
      6) Empresa/Produto: "Estrela". Bichinho Virtual do Gugu.
      Narrativa: "Vocês já viram muitos bichinhos virtuais, mas não os meus. Chegaram os Puppys do Gugu. Tem o Dino, o Cachorro e o Pinguim. Dá até para você colecionar. E ainda eles vêem com um diário e um cordão para vocês carregarem. Ah! Os únicos com tela colorida. Puppy da Estrela: os amiguinhos virtuais do Gugu!"
      Imagem: Gugu Liberato apresenta três modelos de bichinhos virtuais, cada qual em uma cor trazendo um determinado tipo de animal.
      Objeto da Coleção: Bichinhos Virtuais.
      7) Empresa/Produto: "Grupo OESP". Jornal O Estado de S. Paulo.
      Narrativa: "Neste domingo o Estadão apresenta Dog City. Peça para seu pai comprar o Estadão neste domingo, que ele fica com o jornal e você com a revistinha e a fita. Coleção Videomagia do Estadão. A promoção mais divertida da semana".
      Imagem: Mostra cenas do desenho animado Dog City e um conjunto de fitas da coleção.
      Objeto da Coleção: Fitas de vídeo de desenhos animados, que são adquiridas no ato de aquisição do jornal Estado de S. Paulo.
      Estes casos mostram alguns indicadores: 1) As coleções dirigem-se às crianças, pedindo para que comprem o produto ou solicitem aos pais; 2) Incorporam os grupos de referência da criança, ou seja, a coleção é sugerida para ser feita em conjunto com colegas, ou então para que estes também participem; 3) Predominam os produtos alimentícios; 4) A coleção possui como "veículo" personagens, heróis, modelos conhecidos da criança; 5) Os comerciais incorporam linguagem visual e falada apropriada à criança, seja num clima de narrativa idêntica a de histórias infantis, seja com efeitos especiais ou desenhos animados. 6) O "approach" dos anúncios é no sentido de vender a coleção como fator de divertimento; 7) Procuram inserir a coleção numa história, com começo, meio e fim; 8) A coleção está sempre revestida com um caráter lúdico e funcional, quer seja para jogar, brincar, reunir etc.
      A publicidade via televisão possui atrativos especiais para a criança, ainda porque no Brasil é a mídia de maior alcance junto a esse público. É pela televisão que as pessoas assistem novelas e filmes, passando a comentá-los no trabalho ou junto aos amigos.
      O comportamento do colecionador de produtos com marcas comerciais encontra na televisão uma série de estímulos apropriados, como os ligados à mensagem e os de âmbito socializante. Seguir a publicidade é seguir a moda e, portanto, estar em sintonia com os amiguinhos. O comercial que atrai a criança é comentado, algo que tem amplos significados, como incorporá-la ao clima da escola, às amizades na rua, à conversa no telefone e computador.
      Mas, talvez, o mais importante atributo que a publicidade possa oferecer ao marketing seja o de considerar o caráter de entretenimento que propicia o colecionismo, sendo uma das poucas válvulas de escape que a criança de hoje possui face às pressões diárias que o ambiente competitivo promovido pela família e sociedade.

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* Gino Giacomini Filho é Doutor e Livre-docente em Comunicação Social; professor da USP, UMESP e IMES.

 
 
 
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