Wilson da Costa Bueno*
O assessor de imprensa
tem, dentre outras certezas, uma que é inexorável:
tudo quase acaba no "clipping". Impresso ou eletrônico,
ele representa a etapa final de um esforço de comunicação,
geralmente empreendido pelo assessor, e mediado pelos veículos
(jornais, revistas, rádio, TV e, mais recentemente,
as publicações on line), tendo em vista divulgar
fatos, informações, produtos etc, de interesse
de uma empresa ou entidade.
Concretamente, o "clipping"
é o recorte ou gravação de uma unidade
informativa (nota em coluna, editorial, notícia,
reportagem, artigo de um colaborador etc) , que consolida
o processo de interação da empresa ou entidade
com um determinado veículo de comunicação.
Embora ele seja a prova
cabal deste esforço de informar (ou influenciar)
a opinião pública, o "clipping"
não exprime, necessariamente, de maneira inequívoca,
o trabalho do profissional de assessoria. Simplesmente,
porque o "clipping" , raramente, é cópia
exata desta intenção, mas uma re-interpretação
empreendida pelo veículo, que a este esforço
incorpora seus filtros, compromissos e interesses. Daí,
aquela ansiedade, vivenciada intensamente pelo assessor,
ao manusear, no dia seguinte, o jornal à procura
da coletiva do presidente da empresa , temeroso de que algo
possa não ter saído a contento. Se fosse cópia
fiel, o "clipping" dificilmente desencaderia,
no assessor, reações tão intensas de
júbilo ou de frustração (e até
mesmo de revolta). Mas essa é a regra do jogo: o
assessor divulga o que acha relevante para a sua empresa
(ou cliente) e o veículo agrega a sua versão.
Muitas vezes (como sabem disso os assessores!), planta-se
uma flor e colhem-se espinhos.
O "clipping",
portanto – e esta perspectiva precisa ser absolutamente
internalizada pelo assessor de imprensa , mas também
pelos seus chefes (ou clientes) – representa aquilo
que os veículos fizeram com o seu trabalho, mas não,
obviamente, o seu próprio trabalho.
Mas, e aí vem
outra verdade que não se pode (ou se deve) contestar:
incompleto ou não, impreciso ou não, equivocado
ou não, o "clipping" é fundamental
. Ele é a matéria prima para o trabalho de
auditoria, a ser feito a posteriori, e que, se bem conduzido,
poderá sinalizar para oportunidades de divulgação,
diagnosticar personalidades e estilos de veículos
e editores e, sobretudo, permitir que as empresas ou entidades
refinem o seu trabalho de relacionamento com a mídia.
Muitas organizações,
no entanto, por economia (nesse caso, o barato realmente
pode sair caro), não dispõem, ainda, de formas
adequadas para recuperar os produtos decorrentes do seu
esforço de comunicação, limitando-se
ao acompanhamento de alguns poucos veículos, ainda
que, originalmente, tenham endereçado os seus releases
(pré-pautas etc) a um conjunto enorme de jornais,
revistas ou meios eletrônicos. Como poderemos ver
mais adiante, esse processo precário de coleta (ou
monitoramento) pode representar um risco para as organizações.
A regra básica
na comunicação moderna é medir o retorno
de ações ou estratégias para que se
possa avaliar, com precisão, a relação
custo x benefício. No caso específico da atividade
de assessoria de imprensa, isso significa ter em mãos
a totalidade do material publicado ou veiculado, de modo
a construir, a cada momento, um perfil deste esforço.
A "clippagem" dos veículos é, por
isso mesmo, uma obrigação e uma responsabilidade
das assessorias que, obviamente, devem recorrer a empresas
especializadas neste mister, embora estas, em sua maioria,
costumem falhar , prometendo uma abrangência que,
quase nunca, podem cumprir. Em boa parte dos casos, elas
pecam também por não utilizarem mão-de-obra
especializada, não conseguindo, portanto, recuperar,
na íntegra, a inserção das empresas
ou entidades nos veículos, o que compromete o trabalho
posterior de avaliação.
Os equívocos da "clippagem"
A "clippagem"
assume características específicas em função
dos veículos. Se eles, por exemplo, forem impressos
(jornais, revistas, newsletters etc), há uma série
de cuidados a serem tomados para que o "clipping",
aqui adequadamente denominado de recorte, seja perfeitamente
identificado. Muitas empresas especializadas cometem, ao
realizarem esta tarefa, erros primários, como:
a) ignorar as chamadas de capa e caderno ou mesmo os
destaques existentes nos sumários ou índices
da publicação
Por erro de leitura
ou por falta de conhecimento, encaminham ao cliente apenas
as matérias internas, não as fazendo acompanhar
pelas chamadas respectivas. Esse equívoco é
grave porque a capa dos jornais, as capas dos cadernos e
mesmos os índices têm um peso importante no
processo de divulgação. Eles emprestam à
notícia (reportagem, editorial, coluna etc) um valor
adicional, porque as destacam do conjunto das unidades informativas
publicadas naquela edição. As capas dos jornais,
dos cadernos e os índices representam, efetivamente,
a vitrine da publicação e ter a empresa ou
entidade nestes espaços pode significar a glória
ou a tragédia para os assessores de imprensa (e para
as organizações que eles representam). Estar
na capa da Veja , da Folha de S. Paulo ou de um jornal de
negócios de prestígio, como a Gazeta Mercantil
e o Valor Econômico (para só citar alguns casos),
pode ser tanto o momento maior de conquistas da assessoria
(se, evidentemente, a publicação favorece
a empresa ou cliente) como o maior de seus pesadelos (se
a organização é penalizada com a veiculação
da notícia). De qualquer forma, uma análise
posterior, como a auditoria de imagem, precisa incluir estas
inserções, sob pena de ficar comprometida.
b) descontextualizar a notícia publicada
Com muita frequência,
as empresas que fazem o trabalho de "clippagem"
retiram as notícias (notas, reportagens) sobre uma
empresa ou entidade de seu contexto de publicação.
Um caso comum é recortar apenas o fragmento (pode
ser um "box") em que a organização
é mencionada, excluindo o resto da matéria
que contextualiza aquele fragmento. Com isso, fica difícil
recuperar a intenção do editor (repórter
etc) e avaliar em que medida a inserção foi
mais ou menos positiva para a organização.
Por exemplo, como saber se a matéria, como um todo,
assumia um tom positivo ou negativo, ou como identificar
os concorrentes que compartilharam conjuntamente a matéria
(será que a organização havia sido
contemplada com um espaço e uma menção
mais favorável do que eles?).
c) Identificar, de maneira incompleta ou imprecisa, o
"clipping"
A identificação
adequada do recorte é absolutamente necessária.
Muitas vezes, as empresas pecam ao cometerem alguns deslizes
sérios na identificação da inserção
da empresa ou entidade em um veículo. Um erro comum
é a descrição incompleta do veículo
(identificá-lo como Jornal do Commercio, sem indicar
explicitamente a cidade e o Estado de publicação,
o que não é correto porque existem, no País,
alguns veículos importantes com o mesmo título,
por exemplo no Rio de Janeiro, em Pernambuco e no Rio Grande
do Sul). Também é importante a descrição
exata do dia, da página e mesmo do caderno em que
a matéria está inserida, para que se possa
, ao mesmo tempo, recuperar esta inserção
e ponderá-la em um trabalho posterior de análise.
O assessor de imprensa sabe a diferença entre estar
na editoria de economia, de política, de cidades
ou de polícia e não dispor desta informação
no "clipping" significa perder um dado fundamental
de avaliação. Muitas empresas que fazem a
"clippagem" costumam (erro imperdoável!)
recortar as notas existentes em colunas (de economia, sociais,
política etc) sem proceder a identificação
precisa daquela coluna em particular. Ora, com isso, a unidade
informativa perde completamente a sua identidade. Saber
se a nota foi publicada na coluna do Nassif , do Joelmir
Betting , do Ancelmo Gois ou de outro colunista é
indispensável, não só pelo peso que
cada um deles tem como detentor de uma espaço privilegiado
de divulgação, mas pela possibilidade de avaliar,
sob o ponto de vista político, estratégico
, comercial ou mesmo ideológico, esta inserção
(e, se for o caso, reforçá-la ou esclarecê-la,
se algo não saiu direito).
O ideal sempre (e o
assessor deve exigir isso da empresa que faz a "clippagem")
é ter a coluna inteira, porque ela é, sempre,
um espaço íntegro, que precisa ser recuperado.
Afinal de contas, como saber se aquela nota extraída
da coluna não estava acima ou abaixo de uma outra
nota que a complementava? Alguns colunistas, como Joelmir
Betting ou Nassif, por exemplo, costumam ter colunas temáticas
(envolvendo, quase sempre, um único tema) e seria
uma perda irreparável, para a contextualização
de uma nota em particular, desvinculá-la do restante
da coluna.
Embora não seja
usual, o assessor de imprensa mais detalhista poderá
solicitar, também, à empresa de "clippagem"
que indique pelo menos o quadrante da página em que
a matéria está inserida (uma página
de jornal , por exemplo, pode ser dividida em quatro partes
). Todo assessor de imprensa sabe a importância de
sua divulgação estar no alto ou no pé
da página, dependendo do tom que a tipifica (notícias
boas deveriam sempre estar no alto da página, não
é verdade? ).
A "clippagem" eletrônica
ou na Web
Se estamos lidando
com veículos eletrônicos (rádio ou TV),
alguns cuidados devem ser também tomados ao se proceder
a "clippagem".
A identificação
da cópia da gravação deve incluir o
canal (TV) ou a emissora (rádio), o programa , o
dia, a hora do início e do término do programa,
porque esses dados serão fundamentais para o processo
de avaliação. Indicar, por exemplo, que foi
o programa Em cima da Hora, da Globonews, sem precisar o
horário de apresentação, não
esclarece o contexto devidamente, porque este programa é
transmitido praticamente durante todo o dia. Como saber
se aquela inserção no programa ocorreu antes
ou depois de um determinado esforço de divulgação
da empresa ou assessoria. Um exemplo: uma empresa é
mencionada em função de um acidente em sua
fábrica. Ao longo do dia, várias notícias
podem focar o mesmo assunto, mas, em virtude da possibilidade
de sucessivas intervenções da empresa (a partir
das suas fontes) ou do trabalho de investigação
da imprensa , estas notícias podem variar bastante
(mais ou menos completas, mais ou menos precisas –
afinal de contas, quantas pessoas morreram ou ficaram feridas,
qual o prejuízo estimado e quais as causas do acidente?).
Saber exatamente o horário da divulgação
permitirá à empresa recuperar o seu esforço
de divulgação, o que lhe permitirá,
inclusive, aprender em que ritmo a imprensa (pelo menos
aquele programa em particular) resgata e faz circular as
informações.
Muitas empresas de "clippagem"
eletrônica podem, também, encaminhar ao assessor
de imprensa apenas o fragmento do programa (de entrevistas,
telejornal etc) em que a organização é
mencionada, o que impede a recuperação do
contexto (de uma vez por todas, o contexto da inserção
precisa ser resgatado sempre!). De novo, tudo pode depender
das circunstâncias em que a empresa ou entidade foi
mencionada e não é razoável não
dispor desta informação.
Evidentemente, a "clippagem"
eletrônica é mais complexa porque obriga a
um acompanhamento amplo dos principais programas (rádio
e TV), exigindo, portanto, das empresas uma estrutura formidável.
Tendo em vista a dificuldade (e o custo respectivo) de "clippar"
todos os canais (lembrar que existem canais regionais, muitos
em nosso País), o mais adequado é identificar
os principais programas a serem acompanhados e concentrar
o seu esforço nesse monitoramento. Com certeza, não
dispor de todas as inserções na mídia
eletrônica significa uma perda (que pode ser mais
ou menos importante), mas, nesse caso, o custo de um acompanhamento
extensivo (24 horas, todos os dias, de todos os canais)
pode ser proibitivo.
A explosão dos
jornais on line e de outros espaços de publicação
na Internet (muitos sites de prestígio incluem notícias,
envolvendo empresas e entidades) requer, hoje um dia, pelo
próprio impacto do noticiário na Web, um acompanhamento
adequado por parte das assessorias, particularmente quando
a divulgação envolve organizações
de alcance nacional.
Algumas empresas de
"clippagem" já fazem este trabalho , mas
algumas solicitações devem ser feitas pela
assessoria de imprensa para que esta tarefa seja realizada
adequadamente.
A identificação
precisa do veículo (publicação on line
ou site) deve incluir, além de seu título
(por exemplo Folha de S. Paulo on line ou site Ambiente
Brasil), a editoria ou seção em que a matéria
foi inserida, o dia e a hora do acesso. A "clippagem"
deve abranger não apenas a matéria em si,
mas, quando for o caso, os possíveis links a ela
relacionados. Vale aqui a mesma observação
feita para os veículos impressos: as notas em colunas
devem ser "clippadas" com a coluna integral e
os contextos das inserções precisam ser recuperados.
Se a menção à empresa ou entidade estiver
num link de uma determinada matéria, é óbvio
que a origem do link precisa ser resgatada.
O dia e a hora de acesso
são dados fundamentais porque os sites e as publicações
on line alteram as notícias num ritmo que pode ser
frenético. Na verdade, uma das saídas para
este acompanhamento pode ser a escolha antecipada, pelo
assessor, dos horários a serem "clippados"
ao longo do dia. A "clippagem" das 24 horas de
todos os jornais on line e sites de importância pode
ser uma tarefa operacionalmente complicada e representar,
mesmo sendo possível, um custo difícil de
suportar.
Enxergando além do "clipping"
Logo, ao início
deste pequeno texto, lembrávamos que o "clipping"
pode ser quase tudo. Agora, talvez seja o momento
de algumas explicações. Em primeiro lugar,
como já vimos, o "clipping" não
é tudo porque não representa, efetivamente,
a reprodução exata do trabalho da assessoria,
mas a sua versão mediada pelos veículos de
comunicação. É importante observar,
portanto, que o "clipping" em si , como unidade
isolada, não agrega valor ao trabalho de relacionamento
com a mídia porque ele só gera conhecimento,
quando comparado, enquanto produto , ao processo global
que lhe deu origem (a coletiva, o release, a entrevista
da fonte, o "kit de imprensa" etc).
É esta comparação
que permite ao assessor de imprensa entender o que ocorreu,
especificamente, com aquele esforço de divulgação
e, o que é fundamental, como aquele veículo
(ou editor, ou colunista etc) decodificou as informações
que lhe foram repassadas. Não conseguir entender
a dinâmica deste processo implica em incorrer nos
mesmos erros ou riscos (se eles ocorreram ou estiveram presentes)
em uma oportunidade futura.
Como fazer esta comparação?
Como avaliar um esforço específico de divulgação?
Como saber se a atividade de relacionamento com a mídia
foi ou está sendo bem realizado?
Há duas formas básicas de realizar este trabalho:
1) a análise tópica de um esforço de
divulgação e
2) a auditoria de imagem propriamente dita.
O primeiro deles remete
a uma perspectiva localizada e visa entender a repercussão
de uma divulgação particular: a comunicação
dos resultados da empresa num determinado período,
o anúncio da abertura de uma nova fábrica,
o lançamento de um produto específico etc.
Como o fato é
singular, o material a ser analisado está circunscrito
a este esforço: basta agrupar os recortes dos jornais
e revistas (e outros meios impressos), as cópias
de programas veiculados nas emissoras de rádio e
TV e os downloads de jornais on line e websites e proceder
a uma comparação que tenha como referência
o trabalho da assessoria. As perguntas básicas ,
neste caso, são: a) o fato sob análise (abertura
da fábrica, resultados da empresa, lançamento
do produto) foi noticiado? Se sim, com que intensidade (
número de unidades informativas e respectivo espaço
ocupado)? b) com que destaque (colunistas de prestígio,
com chamadas de capa ou caderno, destaques na homepage do
site, chamadas na página de abertura dos jornais
on line? c) quais veículos reproduziram ou ignoraram
esta informação? Os veículos que aderiram
à divulgação são exatamente
aqueles de que se cogitava, tendo em vista o fato específico
e o público que se pretendia atingir? d) em que espaços
(cadernos, colunas, editorias etc) o fato foi noticiado?
e) as ilustrações possíveis (fotos
de entrevistados, das instalações da empresa,
dos produtos etc) foram aproveitadas na divulgação?
f) os veículos utilizaram o material visual oferecido
ou produziram suas próprias imagens? g) as informações
reproduziram fielmente as falas das fontes, os textos dos
releases ou do "kit de imprensa"? h) quais informações
foram destacadas pelos jornalistas e quais não foram
de seu interesse, portanto descartadas na publicação
nos diferentes veículos; i) houve diferenças,
no aproveitamento do material por parte dos diferentes veículos
(por exemplo, nas publicações de negócios,
especializadas ou da imprensa de informação
geral)? j) como comparar a divulgação pela
mídia impressa com a eletrônica e com o jornalismo
on line? Que aspectos distintitivos da cobertura podem ser
indicados para estas diferentes mídias?
Esta análise
tópica não pressupõe, necessariamente,
a consideração de esforços outros de
divulgação dos concorrentes porque foca apenas
a singularidade daquela divulgação particular.
O que se quer saber é o resultado concreto daquele
processo de comunicação que esteve associado
a um evento determinado.
Embora específica,
esta análise é importante porque permite incorporar
conhecimento sobre o comportamento de veículos ,
editores e colunistas e, sobretudo, indica como agir para
incrementar a divulgação.
O assessor de imprensa
deve envidar esforços também para descobrir
porque as coisas não funcionaram, como se imaginava:
por que alguns veículos não cobriram o fato?
porque os veúculos trabalharam aquela informação
daquela maneira? por que aquele aspecto foi para o lead
ou para o título? por que o colunista trabalhou a
informação sob aquele ângulo? Os veículos
(e os jornalistas) tendem a se comportar assim em função
deste fato específico (acidentes, lançamento
de produtos, cotação das ações
da empresa na bolsa, mudança de presidência
etc)?
Já a auditoria
de imagem representa uma análise muito mais elaborada
e geralmente se reporta a um determinado período
de cobertura da mídia e não, à analise
de um fato singular. Comumente (talvez seja fundamental
que isso ocorra sempre), incorpora não apenas a análise
do cliente em particular, mas também de seus concorrentes,
porque é difícil avaliar a eficácia
de um trabalho, sem ter qualquer referência para a
comparação. Como a assessoria da Nestlé
pode saber se seu trabalho foi competente, por exemplo,
se não tem dado sobre o desempenho de seus principais
concorrentes? A eficácia, em geral, é um conceito
relativo e, sobretudo, nesse caso, não se "pode
cantar de galo", sem ter a visão global de todo
o terreiro.
A auditoria tem sido
realizada por inúmeras empresas, ainda que alguns
equívocos geralmente venham sendo cometidos, quase
sempre acarretando ou análises inadequadas ou mesmo
comprometendo o próprio sentido deste trabalho (a
experiência dolorosa com algumas firmas de auditoria
– que, aliás, nunca fizeram, verdadeiramente,
uma auditoria, mas um cálculo pífio de centimetragem
– tem afastado os clientes potenciais deste trabalho,
que o julgam preconceituosamente.)
É possível
identificar, de imediato, alguns problemas inerentes a este
trabalho mal realizado e que, obrigatoriamente, devem ser
contornados.
O mito da centimetragem
Algumas empresas (com
a complacência de assessorias de imprensa) emprestam
valor exagerado ao espaço ocupado pela divulgação
da empresa, norteando a sua análise meramente sob
o ponto de vista quantitativo: quantas matérias foram
publicadas e o respectivo volume de cobertura (medido em
cm2 ou cm x col). Não se pretende ignorar que a dimensão
da divulgação é um dado importante
do esforço de assessoria de imprensa: afinal de contas,
a tarefa, quase sempre, é divulgar amplamente um
fato, processo ou produto sob a responsabilidade de uma
empresa ou entidade (a cliente da assessoria). Mas é
preciso ter em mente que não é tudo. Ás
vezes, consegue-se um espaço nominalmente generoso,
mas pouco representativo seja em termos dos veículos
que aderiram à divulgação, seja em
relação ao público que se pretendia
atingir. Tanto quanto saber o espaço total obtido
com a divulgado é importante saber quem divulgou
e em que circunstâncias. Se os veículos interpretaram
mal as informações ou as contextualizaram
penalizando a empresa, o aumento do volume de cobertura
terá, nesse caso, um impacto negativo.
Algumas assessorias
externas costumam acumular recortes, cópias de programas
(rádio e TV) ou mesmo de divulgação
em sites (jornais on line, por exemplo), sem atentar para
a qualidade da divulgação, o que, convenhamos,
deve ser sempre a preocupação do assessor
da organização ou entidade. A máxima
a ser seguida: melhor do que divulgar muito, é divulgar
bem.
Confundir jornalismo com publicidade
Algumas empresas de
análise (muitas vezes, a mando da assessoria) costumam
"precificar" o espaço obtido com a divulgação,
multiplicando a centimetragem pela tabela de anúncio
dos veículos. Incorrem, desta forma, em dois erros
graves: a) depreciam a divulgação jornalística
e b) "chutam" o custo da publicação.
A depreciação
da divulgação jornalística ocorre porque
(e todo assessor deveria estar convicto disso!) o espaço
editorial, particularmente em veículo sério
ou de prestígio, tem um peso maior do que o espaço
publicitário. Com algum recurso (que pode, é
lógico, ser volumoso para espaços amplos em
jornais de circulação nacional), uma empresa
pode veicular um anúncio, enaltecendo a administração,
comunicando o lançamento de um produto ou divulgação
seus bons resultados. Se a publicidade não violar
qualquer norma ética (discriminação
racial, incitamento à violência, atentado ao
pudor etc), ela será publicada: as coisas se resolvem
no departamento comercial ou num simples balcão de
recepção de anúncios. A obtenção
de um espaço editorial exige (pelo menos para os
veículos sérios) o comprometimento da redação,
que assume que a informação encaminhada pela
assessoria de imprensa é relevante para os seus leitores
(radiouvintes, telespectadores, internautas) e, portanto,
merece publicação. O departamento comercial
está, em princípio, fora da jogada e não
interfere neste processo. Obter esse espaço é
uma conquista da assessoria (certamente, com a participação
decisiva da empresa ou entidade que colabora com a sua credibilidade,
com a geração de informações
relevantes etc). Considerar publicidade e jornalismo como
a mesma modalidade de divulgação é
contribuir para a desvalorização do trabalho
da assessoria. Se alguém ainda tem dúvida
disso, vamos a um caso particular: a notinha de 4 cm publicada
no Painel SA, da Folha de S. Paulo, ou a referência
elogiosa na coluna do Joelmir Betting (que só ocupou
uma linha) pode ser medida pela conversão deste espaço
em publicidade, usando-se a tabela de anúncios dos
veículos?
Além disso, é
muito difícil saber com precisão quanto custaria,
efetivamente, o espaço de uma inserção
publicitária, porque, fora do balcão de anúncios
, a negociação em cima da tabela oficial é
sempre um exercício complicado. Na prática,
a tabela serve apenas como uma referência e, como
o regulamento dos campeonatos de futebol no Brasil, é
rasgada a qualquer momento, por interesse das partes. Lógico,
converter espaço publicado em verba publicitária
pode significar um "chute"e, com certeza, legitima
uma grande "besteira" conceitual.
Positivo x negativo
Uma das contestações
mais frequentes ao trabalho de auditoria de imagem diz respeito
à definição sobre a angulação
da matéria (editorial, artigo, nota em coluna etc).
Do ponto de vista prático, não há,
certamente, dificuldade em definir se uma matéria
é positiva, negativa ou neutra. Basta o assessor
de imprensa verificar se a unidade informativa (nota, notícia,
editorial, nota em coluna, artigo etc) contribui para formar
a imagem positiva da empresa ou entidade; se ela degrada
a imagem ou se, na verdade, a referência não
inclui juízo de valor. Mais do que qualquer outro
profissional, o assessor de imprensa está capacitado
a fazer esta avaliação porque sua reputação,
como gestor do processo de relacionamento com a mídia,
ele depende, basicamente, da circulação de
informações positivas sobre o seu cliente
(empresa ou entidade). Como já apontamos anteriormente,
esta avaliação não deve levar em conta
apenas o fato de que a informação sobre a
empresa ou entidade foi publicada, mas como foi veiculada
(as informações estavam corretas? o veículo
as contextualizou direito? a empresa ou entidade saiu lucrando
com a divulgação?).
Muitas assessorias,
desavisadamente, ou sob pressão do cliente, iniciam
um processo de divulgação que, por ocorrer
em tempo inoportuno, envolver um assunto que pode ser contextualizado
negativamente para a empresa ou entidade, ou endereçar-se
a um veículo (ou profissional) inadequado, acabam
gerando uma divulgação desfavorável.
Os exemplos são fáceis de reunir.
Imaginemos a primeira
situação. Uma grande empresa decide divulgar
o empréstimo (vultoso) recebido do BNDES, exatamente
quando a mídia está debatendo o apoio do Governo
a grandes empresas, em detrimento dos investimentos sociais
ou da saúde das pequenas empresas. Uma notícia
gerada, neste momento, com certeza, irá repercutir
desfavoravelmente e poderá levar a organização
a ser penalizada com um noticiário negativo.
A segunda situação
pode ser o esforço de uma empresa de comunicar que
as vendas de uma determinada linha de produtos aumentaram
no último trimestre. O veículo, contextualizando
aquela informação, descobre que a empresa
tem uma participação pífia naquele
segmento e, ao invés de divulgar apenas aquela informação
específica, abre uma matéria maior sobre a
participação das empresas naquela linha de
produtos, estabelecendo uma comparação ou
um ranking. Se a empresa não está liderando
o mercado, acabará, pela ânsia de estar na
mídia, desencadeando um processo de divulgação
que lhe será desfavorável. A pergunta a ser
feita é: terá valido a pena ter "cutucado
o leão"?
A terceira situação
a ser relatada é aquela em que a empresa encaminha
uma informação sobre aumento de produção
(por exemplo, uma indústria química ou siderúrgica)
para diversos veículos e colunistas, sem atentar
para o fato de que, ao acessar, por exemplo, um veículo
ou colunista comprometido com a questão ambiental,
poderá gerar uma pergunta básica: há
um processo de gestão ambiental associado a este
novo investimento? Sobretudo, se a informação
repassada aos veículos (e jornalistas) não
incluir este detalhe, provavelmente a notícia será
publicada com esse questionamento. Pior será se realmente
o aumento de produção não tiver sido
acompanhado por estes cuidados ou se a empresa tem um passivo
ambiental que a torna vulnerável a este tipo de divulgação.
Enfim, a geração
de uma matéria positiva ou negativa não depende
apenas da informação em si, mas de uma série
de fatores que precisam ser considerados no processo de
divulgação. Isso nos remete a considerações
que privilegiam o momento do processo que ocorre bem antes
de se chegar ao "clipping". Ou que remetem ao
que deve acontecer após se ter o "clipping"
em mãos.
O buraco está à
frente e atrás do "clipping"
Algumas assessorias
continuam insistindo em utilizar cadastros gerais para encaminhar
os seus releases ou pré-pautas para os veículos.
Não que alguns cadastros existentes (Maxipress ou
MegaBrasil, por exemplo) não funcionem: pelo contrário,
sobretudo os anteriormente citados, são bastante
atualizados e desfrutam de prestígio no mercado.
O problema é que não faz sentido e, o que
é pior, representa um alto risco encaminhar informações
para veículos que não se conhece, porque,
excetuados alguns casos, pode-se simplesmente entupir redações
com material que não está em sintonia com
uma linha editorial específica.
A idéia, assumida
por algumas assessorias, de que "tudo que cai na rede
é peixe" não se aplica nestes casos,
porque é preciso pensar principalmente nos jornais
(e jornalistas) que, por algum motivo, não encontram
interesse naquela informação (release, pré-pauta
etc) a eles encaminhada.
Se o desencontro de
interesses se repete com frequência (há assessorias
que encaminham releases e estabelecem contatos semanalmente),
e se a informação repassada não é
relevante (como saber se o veículo tem interesse
se a assessoria não o conhece?), o mais provável
(pode-se assumir, mesmo a curto prazo, isso como uma certeza)
é que o jornalista (editor, redator de redação
etc) descarte sem abrir o envelope ou o e-mail oriundo daquela
assessoria. Por que perder tempo com alguém que geralmente
erra o alvo?
Os cadastros de veículos
(e jornalistas) não devem ser usados para gerar um
monte de etiquetas e e-mails, mas sim, para manter atualizados
um "mailing" realmente seletivo. Normalmente,
a postura de encaminhar o material para todo mundo, para
ver o que acontece, é típica de assessorias
que privilegiam a quantidade e que, certamente, não
praticam o relacionamento com a mídia com inteligência.
Outra prática
comum (e também equivocada) consiste em ignorar os
jornais regionais e comunitários, como se eles representassem
um segmento menor da imprensa brasileira. Em todos os casos,
mas particularmente quando a empresa ou entidade tem vínculos
com determinadas localidades, os veículos locais
devem ser contemplados com a mesma atenção
que se dedica aos meios de comunicação de
alcance nacional. Com a capilaridade das redes de informação,
potencializada pela Internet, a importância de cada
veículo se viu ampliada, pela possibilidade que tem
de influenciar na circulação de informações.
Um jornal de Paulínia, pequena cidade do interior
de São Paulo, pode gerar uma informação
(sobre a contaminação do solo ou do lençol
freático) que irá, num primeiro momento, repercutir
numa cidade maior, ao lado (no caso, Campinas), que, por
sua vez, acabará por estimular a cobertura dos jornais
de São Paulo ou da própria televisão,
de alcance nacional. O assessor, que duvida desta possibilidade,
poderá perguntar à Shell: ela tem uma experiência
para relatar exatamente sobre esse caso. Por isso, a "clippagem"
precisa se reportar aos jornais comunitários, regionais
etc porque a informação corre, hoje, com muita
rapidez e, mesmo gerada num pequeno riacho , pode contaminar
o mar lá à frente. O assessor que tem consciência
deste processo pode, em tempo hábil, estancar a contaminação.
Caso contrário, terá dificuldade para reverter
o processo: talvez a opinião pública não
esteja atenta para o que ocorre num córrego, perdido
em uma cidade do interior, mas certamente estará
de olhos abertos para o que ocorre na Baía da Guanabara.
Dá para perceber a diferença em agir prontamente?
As assessorias não
devem ignorar, ainda, a importância crescente dos
colunistas no jornalismo brasileiro. Alguns deles (vamos
lá: Joelmir Betting, Luís Nassif, Celso Pinto,
Ancelmo Góis, Ricardo Boechat, Washington Novaes
, José Simão, Elio Gaspari etc) representam,
para muitos veículos (e alguns deles são republicados
em muitos jornais do País) o espaço com maior
índice de leitura, o que justifica serem disputados
a peso de ouro.
Mas aí vem o
problema: como eles são "donos" do espaço,
municiá-los com informação não
é uma tarefa fácil. Em primeiro lugar, são
muito bem informados e desprezam aquilo que não é
relevante. Em segundo lugar, desempenham inúmeros
papéis e acumulam muitas atividades, logo não
têm tempo a perder. Finalmente, eles têm seus
interesses, expectativas e compromissos. Assim, para o relacionamento
com esses verdadeiros e importantes formadores de opinião,
é preciso um conhecimento prévio de seu trabalho
, de suas opiniões etc. O assessor de imprensa já
imaginou acessar um colunista, contrário à
privatização, para revelar que está
disputando o controle de uma estatal de prestígio
ou fazer circular uma informação do presidente
da sua empresa contra a ineficácia das estatais?
Ou no estrago que poderia causar ao seu cliente ao repassar
a um colunista, comprometido com o meio ambiente, que a
empresa está se propondo a implantar um grande projeto
na Amazônia, sem especificar, de imediato, o plano
de gestão ambiental?
Antes do "clipping",
deve existir um planejamento calcado em bancos de dados
inteligentes e no conhecimento profundo da empresa ou entidade,
do mercado e da imprensa (vista aqui não de forma
genérica, mas como um conjunto de espaços
personalizados, comprometidos com interesses e preferências).
Depois do "clipping", deve existir um mecanismo
que conduza a uma verdadeira auditoria do trabalho de relacionamento
com a mídia e que, também, se respalde em
um sistema de inteligência empresarial. A assessoria
de imprensa moderna não apenas faz acontecer, mas
reflete, sistematicamente, sobre a sua prática porque
esse processo de avaliação e aprendizagem
contínua é, hoje, um diferencial importante.
O "clipping",
por isso, não é tudo. Mas entendê-lo,
sob essa perspectiva abrangente, será sempre um ótimo
começo.
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* Wilson da Costa Bueno é jornalista, professor
do programa de Pós-Graduação em Comunicação
Social da UMESP e de Jornalismo da ECA/USP, diretor da Comtexto
Comunicação e Pesquisa.